domingo, 14 de outubro de 2012

Fragmento Ulisses 1

Com a crueldade de uma criança que não sabe que até um corpo fragil é capaz de matar, Ulisses arranca um dos meus olhos, e sorri. Enquanto me esforço para adaptar-me a minha nova condição visual, tateio móveis e pessoas, procurando segurança em meus passos, que procuram cantos e uma palavra desconhecida que possa me tirar desse texto/ festa/casa/floresta/deserto/ que encontro-me.
Não sou eu, Penélope, vítima, pois de pequena aprendi que mesmo os animais em abate são capazes de fuga. Não /estou/sou eu, Penélope. Não sei fugir.
Como se não bastasse a ausência de um dos meus olhos, Ulisses parte, não a cavalo, mas em bicicleta, pedindo-me um carinho, que não sei ainda em que irá usá-lo.
Ele, Ulisses, que com pernas firmes atravessa cidades e fantasmas, precisa do pouco que me restou para poder ir embora.
Ulisses dorme em paz?
O binômio leveza- peso, que poderia descrever Ulisses e Penélope não tem mais aqui espaço, pois não há gravidade nessa história, logo, as massas dos corpos flutuam de maneira espectral. A unica coisa que cede a gravidade é sangue, que escorre do olho furado até esvaziar toda e qualquer paisagem de festa/texto/casa/floresta/deserto que encontramo-nos.

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