quarta-feira, 6 de abril de 2011

a mulher na escada

Fotografia de Ricardo Pozzo


"O sexo despedaça o corpo e o amor o reconstitui" C. Calligaris

Na escada vive a Mulher sem Rosto. Uma mulher nua. Quase Rompida. São 11 horas da manhã. A mulher está já um pouco atrasada. A força da imagem ao lado (a fotografia) é mais forte do que essas palavras que com urgência abandono nessa tela. Toda pessoa ja deve ter ouvido a ironia de alguem que diz que vai passar perfume para tirar uma foto. Nessa ironia cliche esconde uma pergunta preciosa. Que cheiro tem algumas imagens? E por que algumas imagens não tem cheiro e nem forma? são sobre perguntas clichês, sobre estados clichês que surgem alguns esboços narrativos. . Esse é um texto clichê. Sobre o corpo depois do sexo, sobre o estranho prazer e solidão de se sentir fodido. A mistura de leite de rosas e esperma espalha-se por toda a arquitetura do prédio antigo. O homem que acabara de partir também não tem rosto. Ela está deitada e ainda sente a ausência e a dilatação que arde em seus buracos. Ela está ocre. A dor que sente é memoria física da recente penetração È. uma constatação. E uma dificuldade em se levantar e juntar seus cacos/pele, seus cacos/desejos, seus cacos/ mulher. Prostrada ela sente o cheiro espalhado pela escada. Cheiro do homem que partiu, cheiro de lagrimas e pó. Ela, a mulher sem rosto, sabe que precisa sair dali, que precisa se levantar e se arrumar para ir trabalhar, para mais um dia fingir que suas pernas são suficientemente fortes para sustentar seu salto-alto. Em qualquer outro canto da cidade o Homem sem Rosto caminha pensando que nunca mais verá a Mulher da Escada, lembra de alguns de seus compromissos da semana, e rapidamente procura alguma revista numa banca de jornal, na tentativa de disfarçar um pequeno nó que apareceu entre seu pescoço e peito.

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